Hoje vamos conhecer a coleção do Lenimar, professor de matemática e colecionador das antigas, repleto de publicações da EBAL e importados da Era de Prata! Uma coleção maravilhosa que ele gentilmente topou mostrar aqui no Pipoca e Nanquim.
Esperamos que curtam, deixem seus comentários para incentivar os colecionadores! Aguardem por mais em breve.
Olá, Lenimar! Muito obrigado por topar participar dessa entrevista.
Para mim, é um prazer poder participar. Gostei muito de várias entrevistas que estão no site. Espero poder contribuir com algo que também possa despertar o interesse dos outros.
Para começar nos conte um pouco sobre você, onde nasceu, mora, o que faz na vida profissional?
Nasci em janeiro de 1962 em Patu, uma pequena cidade do alto sertão do Rio Grande do Norte. Morei em Patu até o início de 1969. Naquele tempo, na minha cidade não tinha energia elétrica, nem água encanada, nem cinemas, nem televisão. É até difícil imaginar a vida hoje em dia sem essas coisas. Tive uma infância muito pobre, mas extremamente feliz, pois eu era muito querido pelos avós e pelos tios.
Aprendi a ler muito novinho, aos 4 anos de idade, e isso chamava muito a atenção dos familiares. Em 1969, meus pais queriam concluir o segundo grau (ensino médio) e, por causa disso, tivemos que mudar de cidade. Sendo assim, mudamos para a cidade de Catolé do Rocha, alto sertão da Paraíba, vizinha à minha cidade natal. Ao contrário de Patu, em Catolé tinha praticamente tudo: energia elétrica, cinema, telefonia, banca de revistas… Fiquei em Catolé até o início de 1978. Mudei para João Pessoa para concluir os estudos e é onde moro até hoje. Desde março de 1984 que sou professor de Matemática da Universidade Federal da Paraíba.
Quando você começou a se interessar por quadrinhos?
Até os 7 anos de idade eu nunca tinha visto uma revista em quadrinhos. No entanto, aos 6 anos eu vi uma folha de uma revista jogada no lixo. Apanhei essa folha, li e achei muito interessante. Cheguei a ficar impressionado com ela. Décadas depois, descobri que a folha que eu tinha achado em um lixo de Patu era de uma reedição da Edição Maravilhosa da EBAL, de outubro de 1967. Aquela folha havia me deixado muito curioso porque se tratava de um personagem mascarado (o Zorro, de capa e espada) e eu nunca tinha imaginado nada parecido com isso.
Você se lembra da primeira vez que se viu fascinado por uma HQ? Qual foi a história ou revista?
Quando mudei para Catolé, uma das primeiras coisas que percebi foi a banca de revistas de lá. Mas, naquela época, eu não comprava nada, apenas olhava a banca. O único dinheiro que eu tinha era 1 cruzeiro novo que meu pai me dava para ir ao cinema no domingo à tarde. E foi assim ao longo de todo o ano de 1969.
Em 1970, eu decidi que era hora de alterar essa situação. Eu não queria mais apenas frequentar o cinema uma vez por semana, queria ler e conhecer todos aqueles personagens mascarados e valentes que eu via nas capas das revistas. Convenci meus pais que eu não estava mais interessado em ir toda semana ao cinema e, usando o cruzeiro novo do ingresso, eu queria comprar revistas. E eles concordaram. Com o valor da entrada do cinema eu comprava uma edição em cores da EBAL ou duas edições em preto e branco. As primeiras revistas que comprei foram Superman 3ª série # 70 e Capitão América em Cores #01, ambas da EBAL. Confesso que não gostei de nenhuma das duas pelo fato de não ter entendido quase nada das histórias. É muito difícil para um menino ingênuo de 8 anos entender prontamente o que se passa nesses complicados universos dos super-heróis Marvel e DC. Mas aquilo não desestimulou a leitura. Depois de ler, cuidava logo de trocar a revista por outra com outros meninos. E assim, no final de 1970 eu já estava completamente apaixonado pelos universos dos super-heróis.
Quando aconteceu a mudança de leitor ocasional para colecionador inveterado?
De 1970 a 1973 eu apenas lia as revistas e, na primeira oportunidade, trocava logo por outras. Era o jeito que a gente tinha para ler um número cada vez maior de quadrinhos. Somente a partir de 1974 foi que resolvi que queria colecioná-las. Em 1975 eu comecei a comprar as revistas diretamente da editora, pelo correio, usando o serviço que eles chamavam de “Venda Direta ao Leitor”. O serviço era até eficiente para a época, demorava apenas 15 dias entre o envio do pedido e o recebimento em casa das revistas. E assim eu comecei a comprar novamente quadrinhos as quais eu já tinha comprado em anos anteriores e que havia trocado por outras.
Quantas HQs você tem?
Minha coleção é pequena. Nunca me interessei por quantidade, só a qualidade me interessa. O período das publicações que me interessam vai do início dos anos 1960 a meados dos anos 1980, antes da “Crise nas Infinitas Terras”. É mais ou menos o que chamam de Era de Prata e início da Era de Bronze dos quadrinhos.
Tenho umas 1800 revistas da EBAL (ou um pouquinho mais do que isso) que inclui umas 30 coleções completas. Tenho também muita coisa da Abril, mas essas eu não contei porque, para mim, são secundárias. Eu tinha praticamente todas as edições Marvel lançadas em 1975-1977 pela Bloch – mas eu me livrei de quase todas elas, pois, na minha opinião, eram de má qualidade (péssima tradução, péssimo colorido) e, hoje em dia, tenho apenas umas 20 revistas da Bloch que guardo apenas a título de recordação daqueles anos.
Tenho os encadernados da Panini que me interessam. Atualmente meu interesse maior são os mais de 130 livros de capa dura importados das coleções DC Archives e Marvel Masterworks, que venho comprando nos últimos 2 anos.
Sua coleção é incrível, 1800 quadirnhos é bastante coisa! Mas então, você não gosta de ler o que é publicado de super-heróis hoje em dia, apenas as publicações da Era de Prata e começo da Bronze?
Em geral, interesso-me apenas pelas publicações das eras de Prata e Bronze. Da Era de Ouro eu tenho apenas coisas isoladas, esporádicas, pouco me interessa desse período. O que é publicado hoje em dia nada me interessa, com exceção apenas dos trabalhos de Alex Ross. Tem certos desenhistas que fizeram grande sucesso comercial nas últimas décadas, mas eu os ignoro completamente. Por volta de 2002, fiz uma limpeza na minha coleção de revistas e joguei fora muita coisa da Abril do final dos anos 80 e praticamente tudo dos anos 90.
Além de super-heróis, você coleciona outro tipo de HQ, como mangás, europeus, etc?
Fora dos universos Marvel e DC dos anos 1960 até 1980, o único tipo de história em quadrinhos que me interessou foi o faroeste italiano conhecido no Brasil como “Histórias do Oeste” que foram publicados parcialmente pela Editora Record e publicado pela EBAL sob o título de Epopéia-TRI. Já li outras coisas como turma da Mônica, Disney, Judoka, Tarzan, Zorro… Mas, sem maiores interesses.
Quais são os principais itens de sua coleção, séries e minisséries completas, encadernados de luxo, edições raras, etc.
Completei as coleções “em cores” da EBAL (Batman em cores, Superman em cores, Superboy em cores, Invictus em cores), as coleções “BI” (Batman-BI, Superman-BI, Superboy-BI), as coleções “em formatinho” (Batman, Superman, Superboy, Invictus,Superduplas, Mulher Maravilha), algumas grandes coleções como Batman 3ª série, Superman 3ª e 4ª séries, Turma Titã,Invictus, Superboy mensal e outras coleções menores como Supermoça, Flash, Gavião Negro, Aquaman, Miriam Lane e Jimmy Olsen, Legião dos Super-Heróis, Os Justiceiros, Superamigos, As Aventuras de Diana, Demolidor, Quarteto Fantástico, A Maior.
Tem outras coleções que eu tenho apenas 90% dos títulos, como Batman 2ª série, Homem-Aranha, Super-X, Thor, Capitão Z.
Ainda hoje, sempre que completo alguma coleção ou compro algo que considero muito interessante, gosto de fazer uma espécie de “comemoração”. Essa “comemoração” é, na verdade, uma sessão de fotos ou a gravação de algum vídeo. Por exemplo, em 2008, quando eu completei a Batman-BI, da EBAL, fiz um vídeo comemorativo e coloquei no YouTube para mostrar aos amigos:
Quais são as maiores raridades da sua coleção?
Acho que são uns números de Superman 1ª série, da década de 1950. Eu tenho, por exemplo, as Superman 1ª série números 93, 94, 97, 98, todas de 1955 e bem difíceis de serem encontradas nos dias de hoje.
Como você fazia para conseguir essas HQs, em uma época em que não existia internet e a distribuição se resumia a bancas de jornal, principalmente a de grandes centros urbanos? Devia ser muito mais difícil de colecionar…
Era muito difícil colecionar na época em que eu morava no sertão (antes de 1978). Naquela época era muito comum a banca receber apenas um único exemplar de cada revista. Aí, se você não fosse rápido na compra, ficava sem o exemplar. E não era todo mês que chegava revista daquele personagem. A gente ficava sempre atento a quem viajava para cidades maiores, como as capitais dos estados, porque essas pessoas que viajavam, em geral, podiam trazer revistas na bagagem da volta.
Além de revistas, todo menino também gostava de álbum de figurinhas. Ás vezes saíam os personagens das histórias em quadrinhos nos álbuns. Por volta de 1970, uma editora publicou uma página de um álbum só com os personagens da Liga da Justiça. Em 1973, outra editora publicou duas páginas com todos os tipos de personagens: faroeste, Disney, Tarzan, Zorro, Batman, Super-Homem, Capitão América, etc. E queríamos sempre mais. Como os álbuns exclusivos de super-heróis que gostávamos nunca apareciam, eu e outro menino resolvemos criar nossos próprios álbuns. Para isso, recortávamos todo tipo de revista colorida e pregávamos os personagens recortados em folhas de caderno. O resultado final até que era bonito. O problema é que as revistas eram completamente destruídas por causa do álbum de recortes. Mas isso não nos intimidava e nosso lema era “revista boa é a que presta para ser recortada (depois de ser lida)”.
Como você faz para comprar essas HQs mais antigas hoje em dia? Corre de sebo em sebo, faz tudo pela internet ou mantém contato com outros colecionadores?
Na maioria dos casos, consegui tudo pela internet. Já mantive contato com outros colecionadores por um período e frequentei alguns poucos sebos. Além disso, uma pequena parte do que tenho foi comprada nas bancas nas décadas de 1970 e 1980.
Como você guarda sua coleção de HQs? E qual técnica usa para conservá-los?
Não uso técnica especial. Apenas coloco cada uma dentro de um saco de plástico, em geral sem os grampos, e agrupo várias revistas ensacadas de uma mesma coleção em um saco maior.
Todo colecionador tem manias, seja um ritual para leitura, uma bela cheirada na revista nova ou nunca se desfazer de nada, qual é a sua?
Acho que o único hábito que tenho que pode ser considerado algo estranho é querer possuir determinadas revistas em duplicata. E, além disso, guardar as duplicatas em locais diferentes, de preferência em cidades diferentes. Isso fornece certa ilusão de segurança, uma impressão de que a gente nunca vai ficar sem a revista.
É verdade que você gosta de escanear as suas revistas antigas e compartilhá-las com outros leitores na internet? Como você faz isso, desmonta as revistas para poder escanear?
Desde 2004 que venho escaneando várias coleções completas. Algumas das publicações que circulam hoje em dia “de site em site” foi eu que fiz o scan. Por exemplo, foi eu que digitalizei a edição comemorativa dos 25 anos da EBAL, a Chamada Geral. Também fui responsável pelo escaneamento de várias coleções completas tais como Turma Titã, Elektron, Flash,Batman-BI, Batman em cores, Superman em cores, Homem-Aranha em cores, Capitão América em cores e outras.
Um dos sites onde elas podem ser encontradas é no
Guia Ebal. Para fazer o
scan, eu retiro os grampos das revistas e, depois de escanear página por página, guardo sem grampos em um saquinho de plástico. Depois de digitalizada, cada página tem que passar por algum tipo de tratamento, tais como rotação de pequenos ângulos e recorte das bordas. Dá muito trabalho fazer isso. Exige muita dedicação e disposição. Mas, para mim, é algo importantíssimo. Já digitalizei umas 400 revistas da EBAL e pretendo escanear pelo menos mais o dobro disso. A revista escaneada pode ser multiplicada e enviada para onde você quiser. É muito bom você viajar e levar, por exemplo, milhares de revistas no disco rígido do computador.
Com seu trabalho escaneando as revistas antigas, você consegue apresentar esse material a outras pessoas. Mas e pessoalmente, você incentiva as pessoas próximas a você, como filhos, sobrinhos, etc, a ler quadrinhos? Costuma deixar que leiam as suas revistas?
Meus filhos têm idades de 22, 23, 25 e 27 anos e nunca se interessaram em ler nenhuma das minhas revistas. Antigamente, eles até que liam algumas coisas da turma da Mônica, mas não passava disso. Meus sobrinhos são muito novinhos e acho que não vão se interessar pelo tipo de quadrinhos que gosto.
Acho que eu deixaria, sim, outra pessoa ler as minhas revistas. Mas teria que ser alguém muito bem escolhido, de confiança. Antigamente, quando eu morava no sertão, sempre tinha algum amigo que lia as histórias que eu adquiria na época. Sempre questionei muito a utilidade das coisas, dos objetos. E uma revista, para mim, é algo que tem que ter alguma utilidade, tem que servir para alguém ler. Não consigo me imaginar possuindo algum objeto que seja intocável, inútil, apenas servindo para enfeite e especulação.
Tem algum item que quer muito ter, mas está praticamente impossível de encontrar?
Os itens que eu quero muito ter são os livros de capa dura DC Archives e Marvel Masterworks. Mas isso eu estou comprando todos os meses. É só uma questão de pouco tempo para ter todos os que me interessam. Tem outros que são difíceis de encontrar, mas que não me interessam tanto assim, tais como os números iniciais da coleção Batman 2ª série da EBAL.
Qual foi sua última leitura e qual está sendo a atual?
A última história que li foi uma de Jimmy Olsen, escrita e desenhada por Jack Kirby e que foi publicada pela Panini recentemente. A Panini publicou apenas uma pequena parte dessa história. A EBAL a publicou na íntegra em 1972 e a Abril também a publicou em 1985. Vivo torcendo para que a Panini a publique na íntegra na forma de um ou dois encadernados.
Não tenho leitura atual, mas estou planejando ler todas as histórias dos meus grupos prediletos, em sequência: Legião dos Super-Heróis, Liga da Justiça e Quarteto Fantástico. Passei muito tempo fazendo essas coleções e agora está na hora de passar algumas semanas lendo.
Obrigado pelo papo, Lenimar! Para finalizar, deixe um recado para os leitores do Pipoca e Nanquim e colecionadores do Brasil.
Meu recado é que vale a pena lutar pelas realizações dos seus sonhos. Há cerca de 10 anos eu apenas imaginava como seria bom poder desfrutar de coleções completas dos personagens que a gente gosta. Eu não conhecia nem as capas das revistas. Hoje, graças à minha persistência e dedicação, posso dizer que realizei esse sonho.
—-